terça-feira, 15 de dezembro de 2009

[00012] Emigração em Pombal (continuação de estudo anónimo e sem data)

Entrevista com o Presidente da Câmara Municipal de Pombal (Dr. Armindo Lopes Carolino).



Continuação

ENTR: Sr. Presidente, qual foi a reacção das pessoas?

A.C. Inicialmente foram soluções difíceis das pessoas entenderem, havendo até um caso ou outro em que as pessoas à revelia do que lhes era exigido construíram e a Câmara viu-se em meia-dúzia de casos perante situações de facto consumadas e acabou por compreender, de algum modo, o estado de espírito das pessoas e apesar de - na apreciação dessas excepções, nunca ter deixado de chamar a atenção para o facto de uma irregularidade de base de um facto consumado, acabou por regularizar essas situações, porque eram realmente excepções. Julgo que haverá no concelho, quando muito, um ou dois casos que não estejam regularizados e não estão porque os interessados não desenvolveram esforços nesse sentido, mas a abertura da Câmara é de modo a evitar um mal maior aos requerentes, dizendo muito embora que não se devia legalizar, etc., etc. acaba por legalizar para evitar demolir.

ENTR: Um dos aspectos também importante desta emigração são as remessas que os emigrantes enviam para o nosso país, muitas vezes para a sua área geográfica de origem/saída. É notório o investimento em alguns sectores, nomeadamente na área da construção civil.

A.C.: Exacto. O emigrante foi durante muito tempo o mercado preferencial da imobiliária, portanto, quer na imobiliária construída de raíz nas suas aldeias de origem, onde melhoraram ou construíram de raíz casas que já tinham e, numa segunda fase, dado o investimento produtivo, adquirindo parcelas de imóveis ou vivendas e propriedade horizontal na sede do Município ou em cidades vizinhas, nomeadamente, Figueira da Foz, Coimbra e também Leiria ou até Nazaré, Entroncamento, Algarve, isto já numa segunda fase. Também no aspecto do comércio e serviços se nota sobretudo nas aldeias e onde houve regresso de emigrantes, um investimento nessa área, através da abertura do talho, do mini-mercado, do café, que são, digamos, pequenas unidades ou médias unidades de serviços às populações locais que uma melhor arrecadação de moeda nos países que os acolheram, lhes permitiram disponibilizar e fazer um investimento aqui em Pombal, ou nas aldeias donde são originários, ou nas sedes mais desenvolvidas, metropolitanas, portanto, onde na sua óptica as remessas podiam ser mais bem rentabilizadas.

ENTR: Pode-se falar também, ao nível da construção civil, não na aquisição de imóveis, mas mais no âmbito da construção. Sr. Presidente, acha que este facto tem sido significativo para a dinamização deste sector ou são casos pontuais?

A.C.: Há uma década a esta parte os investidores da construção civil de imobiliário para transacção comercial, têm alguns elementos ligados à própria emigração ou a empresas privadas em nome individual que ligadas à construção civil nos países onde estiveram, sobretudo em França, e que depois regressados a Portugal, já nessa época em que poucos regressavam, enveredaram pela construção civil; temos o caso de dois ou três empresários aqui da nossa cidade e de alguns que estão sediados em Freguesias constituintes do Município que, efectivamente, para além de terem construído para si e investindo nas suas vivendas, acabaram por ou em nome individual ou através de empresas que entretanto construíram, enveredar pela indústria da construção civil, não restando dúvida nenhuma que foi com base nos dinheiros da emigração e inicialmente também aproveitando as facilidades de crédito, que as empresas bancárias, sobretudo os Bancos que recebiam as remessas desses emigrantes, utilizando o quadro normativo em vigor que lhes dava possibilidade de recurso a crédito, portanto, nesses investimentos que foram aproveitados e que depois acabaram por construir, firmas que hoje são firmas sólidas e que mantém a sua actividade na área da construção civil.

ENTR: Outro sector onde foi significativa a "fuga" das pessoas que emigraram foi no sector da agricultura, podendo-se falar quase que numa desertificação dos campos, quer ao nível do trabalho quer ao nível da mão-de-obra. Até que ponto isso foi significativo para o desenvolvimento da indústria?

A.C. É verdade que esta mudança de base na economia de subsistência contribuiu para que o Município de Pombal recorresse exactamente a essa mão-de-obra agrícola, a qual de acordo com as estatísticas em determinadas alturas estaria na ordem dos 60% a 70%, para fazer face à transição de operários que depois se acabaram de qualificar através de outras coisas, que se recorreu, dizia eu, para reforçar a mão-de-obra no sector secundário (indústria) e hoje, na minha opinião, o sector secundário ocupa a maior quota de população de mão-de-obra activa. Portanto, o sector da indústria de Pombal hoje deve ocupar na ordem dos 40 a 45% dos activos, tendo a agricultura descido para a ordem dos 25 a 30%, mais ou menos nas mesmas proporções e percentagens que o comércio e serviços, portanto julgo que estes são mais ou menos os números em percentagem em que podemos fazer fé e dizer que realmente a subida dos activos, no sector secundário, se ficou a dever ou se fez essencialmente à custa de mão-de-obra de activos que até aqui teoricamente era mão-de-obra de activos da agricultura.

Nota da dona do Blogue: Esta entrevista é elucidativa da deficiente estruturação da nossa economia. Uma base de desenvolvimento comprometida na construção civil e empreitadas, leva, mais tarde ou mais cedo, à estagnação económica como tão bem, a recente crise mundial, exemplificou.
Nota suplementar: Não fizemos correcções formais nem de conteúdo, nestas transcrições - as deficiências de linguagem são reais, ipsis verbis, o documento original, o que nos permite aquilatar do nível cultural, tanto dos entrevistadores quanto dos entrevistados. Em Pombal é muito antigo este eclipse intelectual.

domingo, 6 de dezembro de 2009

[00011] Emigração em Pombal (continuação de estudo anónimo e sem data)


Entrevista com o Presidente da Câmara Municipal de Pombal (Dr. Armindo Lopes Carolino).


Continuação

ENTR: Não podemos entender isso como uma consequência da entrada na Comunidade Europeia, dado que há uma maior liberalização das fronteiras?

A.C.: Não. Eu penso que não por isto: é que a entrada na CE dará teoricamente, as mesmas condições a qualquer trabalhador proveniente dos Doze, no caso destas ondas migratórias e quem falava com eles sabia, que na realidade eles e elas não tinham as mesmas condições que os naturais desses países; por outro lado, e porque a Suíça, que era um dos locais de destino mais privilegiado por estes grupos de jovens, como sabe ainda não aderiu à CE e, portanto, não está obrigada a cumprir e a satisfazer todos os direitos que teoricamente o cidadão europeu goza em qualquer país da Comunidade Europeia.

ENTR: Ainda voltando um pouco às preocupações por parte do Poder Local, no mandato que está a decorrer e que tem como líder o Sr. Presidente, todo o desenvolvimento e as preocupações com determinadas infra-estruturas, nomeadamente, água, saneamento, etc... também directa e indirectamente têm contribuído para a fixação da população, dado que é criado um conjunto de condições que faz com que as pessoas se vão sentindo bem nas suas terras. Concorda?

A.C.: Sim é verdade, que as melhores condições de vida, as melhores hipóteses de construção de postos de trabalho que não se verificavam há décadas atrás, começaram a levar as pessoas a poder fixar-se melhor e a usufruir de uma qualidade de vida que há 10 ou 20 anos não era possível e que portanto se ia procurar noutro lado e hoje também o facto de pertencermos à CE, onde como parceiros comunitários somos obrigados a cumprir regras que são efectivamente regras de ouro da CE, no sentido de todos os cidadãos terem um tratamento idêntico perante a lei e perante as condições de vida. Foram efectivamente factores que influenciaram decisivamente, também, a fixação das pessoas, porque se as pessoas hoje disponibilizam de determinadas infra-estruturas que lhe facilitam a qualidade de vida antes de abandonarem aquilo que já é seu e que é adquirido, deixando de algum modo ao abandono, para ir hoje procurar melhores condições de vida acaba por influenciar decisivamente em determinadas opções que as pessoas tomam na sua vida privada.

ENTR: Sr. Presidente, tem-se verificado, nomeadamente a partir dos anos 80, o regresso de alguns emigrantes. Que medidas têm sido tomadas no sentido da reintegração dessas pessoas, nomeadamente dos filhos dos emigrantes.

A.C.: Não- há um pacote de medidas específicas para resolver problemas de ex-emigrantes que regressam. Agora o que me parece é que exactamente essa criação da melhor qualidade de vida, o apoio que se lhes dá quando eles têm problemas a resolver junto Administração, para a abertura de uma casa comercial, de um restaurante, o acompanhamento através dos serviços técnicos da Câmara Municipal de Pombal, facilitar a esses investidores que regressam determinados apoios e sobretudo no caminho burocrático, ajudando-os a vencer determinados problemas e facilitando-lhes a vida sempre que possível, são medidas que têm influenciado também a parte do apoio da Câmara e o Poder Local às pessoas/emigrantes que regressam e têm de algum modo sido eficazes.

ENTR: A emigração marcou imensamente o Município a nível paisagístico, o que, aliás, podemos constatar fazendo uma pequena visita pelo concelho, ou seja, a adopção de um estilo arquitectónico que não se compadece muito com o estilo da zona. Neste momento sei que as coisas já não se processam com tanta facilidade. Quais foram as medidas que a Câmara tomou no sentido de exigir a estes emigrantes um certo rigor em termos arquitectónicos e adequação àquilo que são as exigências do município?

A.C.: Pensamos que houve uma época que em termos de construções marcou aquilo que nós chamámos - época da emigração. Os telhados inclinados, lembrando casas da Normandia, por causa da neve, telhados pretos, telhados recortados, os ditos "greniers". Nós, e vincada que estava esta arquitectura, começámos por fazer uma acção de mentalização, começando a chamar os requerentes que apresentavam essas soluções arquitectónicas e tentando de uma maneira pedagógica esclarecer que aquelas construções não eram adequadas ao nosso clima e à nossa zona, que nós tínhamos uma arquitectura própria. As pessoas foram começando a entender, e depois numa segunda fase, reunimos todos os técnicos inscritos na Câmara, dizendo que quando apresentassem soluções dessa natureza a Câmara dificilmente as aprovaria e através deste trabalho, que foi um, trabalho moroso, mas ao mesmo tempo um trabalho de resultados conseguiu que hoje praticamente ninguém apresente essas soluções, tirando um caso ou outro esporádico que aparece porque as pessoas não têm conhecimento destas regras ou porque ainda estão imbuídas de uma certa influência dessas casas que viram nos países de acolhimento onde trabalharam esses anos todos e quiseram de algum modo transportar para cá, para a sua terra, essas soluções arquitectónicas. Hoje, já não é vulgar entrarem pedidos na Repartição Administrativa de Obras Particulares da Câmara Municipal, onde as solicitações dessa arquitectura de emigração seja solicitada, pelo que me parece, realmente, esse período ficou marcado mas hoje já não temos problemas dessa natureza.
Continua